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Como a ferramenta Maze contribuiu para engajar uma cultura de testes com usuário e torná-los escaláveis dentro de uma gigante do setor de varejo.


Não é novidade que a gente vive no digital 90% do nosso tempo. Nossa vida acontece através de apps e sites: nosso trabalho, nossas finanças, moradia, entretenimento, relacionamentos… compras então, nem se fale. “Colocar no carrinho”, “frete grátis”, “finalizar compra”… é o que mais fazemos ultimamente e virou nossa rotina por 2 anos durante a pandemia. Mas, essa nossa interação com produtos e serviços digitais é extremamente dinâmica, pois, à medida que nosso contexto muda, nosso comportamento muda. Logo, nosso jeito de interagir com tudo à nossa volta também muda. Então, para melhorar o uso de soluções digitais, é só mudar um texto ou a cor de um botão, certo? Nesse artigo, vamos entender como escalar a cultura dos testes de usabilidade para evoluir nossos produtos digitais e proporcionar melhores experiências e, consequentemente, deixar as decisões e tarefas das pessoas mais simples e agradáveis no dia a dia.

O fantástico mundo dos testes de usabilidade

Se eu fosse resumir o que é teste de usabilidade em 10 segundos, eu citaria a antropóloga Margaret Mead: “O que as pessoas dizem, o que as pessoas fazem, e o que as pessoas dizem que fazem são coisas completamente diferentes.”

Mas, esse assunto vale bem mais que 10 segundos, então vamos ao conteúdo!Imagine você abrindo o app do seu banco para pagar uma conta, você tem seu próprio caminho ali dentro: a sequência de ações, onde escolhe clicar, o quanto você rola a tela para cima ou para baixo; tudo depende da tarefa que você precisa realizar e do seu jeito de pensar e fazer.Imagine agora que você precisa explicar para alguém como pagar uma conta usando o app deste banco. É muito provável que você explique de um jeito diferente do que faria ali na hora, só você e o app! Isso acontece porque a fala, neste caso, a explicação de como pagar uma conta no app do banco, requer uma estrutura de pensamento prévia, uma lógica de comunicação para passar a informação. Provavelmente, você vai pegar o seu modo de fazer como referência, mas vai pensar em uma forma mais didática de explicar, com uma lógica do que você imagina que deva ser.Quando é você quem está navegando pelo app, o fazer é mais intuitivo e o racional é indireto. Primeiro pensamos, sim, no que precisamos fazer, isso gera uma emoção que nos causa uma reação e, então, agimos. A interação é conduzida muito mais por um comportamento emocional. Por isso, Usabilidade é um tema de grande relevância na concepção de produtos digitais.

O que é usabilidade?

Ilustração de um smartphone

Antes de falar do seu papel dentro do processo de design de experiência, acho válido esclarecer o que é usabilidade no contexto de produtos digitais. Para isso, ninguém menos que Jakob Nielsen, junto com, Donald Norman, fundadores do Nielsen Norman Group, que publica periodicamente estudos e artigos sobre Usabilidade, Design e Experiência do Usuário, trazem o seguinte conceito: “Usabilidade é atributo de qualidade para avaliar a facilidade de uso de uma interface. A palavra “usabilidade” também se refere a métodos para melhorar a facilidade de uso durante o processo de design.” Nesse contexto, foram estabelecidas 10 Heurísticas de Nielsen, nas quais nos baseamos para evoluir e projetar soluções, com objetivo de garantir interfaces fáceis de aprender a usar, eficientes, eficazes, tolerantes a erros e encantadoras. Os testes de usabilidade servem justamente para observar o usuário interagir com a interface e avaliar se o que projetamos cumpre os requisitos, oferecendo uma boa experiência e usabilidade.

O papel dos testes de Usabilidade dentro do processo de Design

Essa imagem foi extraída do Ciclo de vida CWI, junto com a Tríade do UX Analytics, e ilustra de forma prática os momentos do Ciclo de Vida do produto em que acontecem os testes de Usabilidade e o seu impacto em todo o processo de Design. Na etapa de Identificação de Oportunidades, podemos avaliar comportamentos e entender as dores e necessidades do usuário: a pergunta aqui é: O que precisamos resolver? Na etapa de Experimentação, é o momento para testar nossas hipóteses de solução e coletar feedbacks e indicadores, antes de implementar qualquer solução. Esse é o momento em que viabilidade, praticabilidade e desejabilidade se cruzam e temos a chance de construir uma solução que entregue valor de fato. Seja um processo de análise reativa (Data discovery) ou proativa (Melhoria contínua), a gestão da experiência parte de um primeiro questionamento: O QUÊ?, seguido de um POR QUÊ? e finaliza com um COMO? Se quebrarmos essa tríade a partir dos dados, percebemos que:

  1. Eles nos fornecem insights de O QUE pode estar acontecendo em nosso produto: pessoas estão saindo da página x, pessoas não estão clicando no botão y, pessoas estão usando um caminho diferente para a tarefa z, e assim por diante.
  2. Então, elaboramos hipóteses e planejamos pesquisas para entender o PORQUÊ está acontecendo x, y ou z.
  3. A partir destes resultados, propomos soluções e testamos com os usuários, para ver se conseguimos resolver o que identificamos no passo 1.

Essa tríade pode se iniciar em qualquer um dos pontos e cada um dos outros dois passos complementa o processo. Executamos pesquisas, identificamos padrões, propomos soluções, testamos, medimos… E, o ciclo continua.

O teste de usabilidade

Trata-se de uma abordagem de pesquisa com usuário. Dentro dos métodos que existem, separamos em pesquisas atitudinais e comportamentais, qualitativas e quantitativas.

Mapa dos tipos de pesquisa com usuário

Os testes com usuários se encontram nos quadrantes qualitativo e quantitativo, pois seus resultados identificam padrões de comportamentos a partir de análise aprofundada do que um usuário FAZ na interação com um produto, com representatividade estatística dependendo da amostragem. Repare que todos os tipos de testes são uma combinação do uso natural do produto e do uso com script (quando há tarefas pré estabelecidas a serem executadas). As outras formas de pesquisa com o usuário se encontram no quadrante abaixo, referente a métodos atitudinais: o que o usuário DIZ QUE FAZ. Todos são válidos, desde que se cumpra o objetivo da pesquisa e busquem responder às hipóteses levantadas.

Por que fazer testes com usuário?

Trazendo um pouco mais para o contexto de e-commerce de varejo, em que trabalhamos em um produto já implementado, existem, basicamente, 3 grandes vantagens de realizar testes com usuários:

  • Insights mais ricos e qualitativos com origem na observação das pessoas usuárias navegando e interagindo com o produto de forma natural e com script;
  • Buy in: é uma ótima fonte de fundamentação de propostas de melhorias, funcionalidades e iniciativas;
  • Fonte de dados qualitativos e quantitativos, permitindo acompanhar e medir indicadores importantes da experiência.

Era uma vez… Como foi a evolução dos testes de usabilidade

Imagens ilustrativas de tipos de teste com usuário

Era muito comum as empresas recrutarem pessoas dentro do seu perfil de cliente para testar seus produtos de forma presencial. Esses testes aconteciam em laboratórios com um moderador e o cliente participante e, do lado de fora, em uma sala espelho, onde havia observadores. Após o cenário remoto se tornar mais que obrigatório, os testes tiveram que se adaptar, afinal a evolução dos produtos não podia parar. A modalidade remota abriu uma nova perspectiva, trazendo escala para os testes e resultados ainda mais promissores e diversos, já que podemos recrutar participantes de qualquer lugar, literalmente. O teste remoto moderado requer algumas ferramentas que permitam o compartilhamento de tela para observar o participante interagindo com o produto. Já o teste remoto não moderado é bastante interessante, pois simula mais a pessoa usuária no seu contexto natural de interação. Para executar qualquer um dos métodos, deixo um resumo das etapas que utilizo no meu dia-a-dia:

  1. Planejamento: definir objetivos do negócio e do estudo, problema de pesquisa, perguntas que desejo responder, público alvo e método a ser aplicado.
  2. Montando o teste: roteiro do teste, prototipação e montagem na ferramenta de coleta.
  3. Piloto do teste: imprescindível para detectar possíveis erros e inconsistências, além da oportunidade de prever problemas que podem acontecer durante o teste.
  4. Recrutamento e agendamento
  5. Coleta: execução dos testes (pode ocorrer debriefing com os observadores em casos de testes moderados)
  6. Análise dos resultados
  7. Documentação
  8. Apresentação para stakeholders: essa etapa é bastante importante não só para dar visibilidade às decisões tomadas no produto, mas também para reforçar a cultura do design e elevar a maturidade de Design na empresa.

As ferramentas de teste de usabilidade remoto

Hoje já existem algumas ferramentas que nos permitem conduzir testes de usabilidade remoto, tanto moderado quanto não moderado, como: Lookback, TryMyUI, UserZoom, Useberry, entre outros. Vou enfatizar aqui o Maze, uma ferramenta que temos usado mais em nossas pesquisas e rotina de testes. O Maze é uma ferramenta com versões gratuita e paga. Sua grande vantagem é que, ainda na versão gratuita, é possível executar ótimos testes e com bons resultados. Algumas vantagens (na versão free):

  • Ferramenta colaborativa com outros do time em tempo real
  • Relatório em forma de apresentação
  • 1 projeto podendo conter até 3 testes
  • Diversas opções de templates de testes como: tree testing, validação de ideias, arquitetura da informação, teste de conteúdo, card sorting, teste a/B, entre outros.

Estudo de caso com o Maze: Teste de usabilidade remoto moderado

Este teste de Usabilidade foi conduzido em uma grande varejista do Brasil, cuja solução deveria ser proposta para as 3 bandeiras. O objetivo do negócio era eliminar uma trava que restringia quantidade máxima de 6 unidades de um produto no carrinho de compras. O objetivo do estudo era entender quais as dores, necessidades e desejos dos usuários quando precisam fazer uma compra em grande quantidade e gerir os produtos no seu carrinho.

Inteface de carrinho testada

Através da coleta de dados com a ferramenta Maze, esperávamos que os usuários usassem o campo de digitar a quantidade, o que se validou, com 87% dos participantes. Por outro lado, descobrimos que uma grande parcela interagiu com o componente de quantidade, 43,5% dos participantes, clicando incessantemente no botão até atingir a quantidade desejada. Ao entrevistar os usuários, após a interação com o protótipo, descobrimos que a experiência não estava nem um pouco prática e agradável. Além disso, avaliamos métricas de usabilidade:

  • Eficiência: os participantes conseguiram finalizar a tarefa no menor tempo possível?
  • Eficácia: os participantes conseguiram atingir o objetivo sem erros ou obstáculos?
  • Agradabilidade: foi uma experiência fluida e agradável?
Resultados coletados da ferramenta Maze: eficácia e satisfação

A partir dos resultados, propusemos uma solução que atendia o objetivo do negócio e a necessidade do usuário:

  • Do ponto de vista da experiência do usuário: um novo componente para gestão da quantidade dos itens no carrinho que permite o usuário ter uma visão objetiva das quantidades disponíveis e o direciona para digitar uma quantidade maior, quando necessário.
  • Do ponto de vista do negócio: o componente permite uma gestão das quantidades dos produtos mais autônoma por parte dos times comerciais, permitindo gerenciar campanhas promocionais, contribuindo com aumento de receita e conversão.
Solução final proposta da interface de carrinho

Após um teste, qual o próximo passo?

Temos dados e feedbacks na mão, o que fazer agora?
Esse é o momento de retomar as perguntas de pesquisa que definimos no planejamento para direcionar a interpretação dos resultados.
Cuidado com os vieses cognitivos, “que são tendências do ser humano capazes de afetar suas avaliações e julgamentos sobre outras pessoas, situações ou decisões.[…] Nós temos a tendência de procurar, interpretar, preferir e recordar informações de uma forma que reforça nossas crenças ou hipóteses pessoais: viés da confirmação.” – Editorial Aela. Todo feedback é válido, não desperdice! Aqui temos a oportunidade de identificar pontos de melhoria não só para o desafio em questão, mas também para outras etapas da jornada que podem ser impactadas por esta, por exemplo.
A documentação e compartilhamento são partes fundamentais desta etapa, em que podemos registrar e detalhar os resultados e suas interpretações, além de fundamentar as decisões de Design. Pode parecer longo e trabalhoso, mas é de extrema importância, pois é dessa forma que conseguimos escalar essas informações e, consequentemente, a cultura dos testes de usabilidade.
Nesse caso, seguimos um modelo de documentação proposto pelo time de ResearchOps e arquivamos no repositório de pesquisa disponibilizado. Dessa forma, toda a empresa tem acesso ao conteúdo, minimizando pesquisas repetidas e retrabalhos. Além disso, participamos de agendas periódicas para apresentar as pesquisas que realizamos, com objetivo de escalar não só a cultura de pesquisas com usuário, mas também de tomada de decisão baseada em dados.

Principais aprendizados que tive fazendo testes

Imagem do Homer e Lisa Simpson estudando juntos

Os testes, além de trazerem aprendizados sobre o comportamento dos usuários, nos ensinam também sobre melhores práticas para evoluir como pessoas e designers, seguem alguns bem valiosos que já tive executando testes:
Tenha sempre um plano bem estruturado antes de começar! As ferramentas de teste ajudam muito a coletar dados quantitativos, mapas de calor e fluxos de uso, mas depende de nós fazermos as perguntas certas. Imprevistos podem acontecer… Sempre faça um teste do teste. Chame seus colegas e peça para eles testarem um piloto para garantir que a ferramenta não está apresentando erros. O piloto do teste nos mostra inconsistências e potenciais problemas que temos a chance de corrigir. E a pessoa usuária? Filtre bem o público alvo! Assim, você consegue resultados mais precisos e gera insights mais assertivos para tomada de decisão. Na hora de elaborar o teste: Ao escrever as tarefas, evite dizer o que fazer e evite também as mesmas palavras que tem no seu produto. Foque no problema! Não busque validar o seu ponto de vista. O que importa é a percepção de quem está testando e não a sua. Chegou a hora do teste e agora? Procure tranquilizar o participante! Explique que você está avaliando a performance do protótipo e não ele. Documente tudo e divida as suas descobertas… Se possível, sempre analise os resultados individuais de cada tarefa e/ou usuário e não apenas o resultado geral. Compartilhar cases de teste com seu time e stakeholders é uma ótima forma de elevar a maturidade de Design dentro da empresa. Faça uma apresentação bem bacana com as descobertas geradas!

Conhecimento bom é aquele que circula!

Gif do Mario

Vamos a algumas dicas de conteúdo e referências no assunto:
Medium Elisa Volpato—Pesquisadora de experiência do usuário, trabalhando com UX desde 2005 e fundadora do TESTR.
Das coisas nascem coisas—Bruno Munari, livro. “O problema não se resolve por si só; no entanto, contém já todos os elementos para a sua solução. É necessário conhecê-los e utilizá-los no projeto de solução.”
Podcast Movimento UX—UX e Teste de Usabilidade com Elisa Volpato—Episódio 06
Podcast Papo de UX—O papel do UX Researcher com Sheylla Lima—Episódio 029
The NN/g UX Podcast—18. Presenting UX Work in a compelling way (feat. David Glazier)
Growth Design—Conteúdos sobre psicologia, design ético, product design e experiência do usuário
Tools of unmoderated usability testing—Artigo NN/g
How to Maximize Insights in User Testing: Stepped User Tasks—Artigo NN/g
Livro “A pergunta mais bonita”—Warren Berger:“Se o questionamento é o ponto inicial para a inovação, o que as empresas e seus líderes podem fazer para encorajá-lo e explorá-lo? E como podemos reacender em cada um de nós a faísca do questionamento, passando a usar essa ferramenta tão poderosa como um meio para repensar e reinventar nossas vidas.”
Livro “E se “—Randall Munroe, garoto prodígio da NASA, tornou-se conhecido com a icônica série em quadrinhos XKCD, que passou a publicar na internet, em 2005. “Mas os fãs do XKCD costumam fazer perguntas estranhas a Munroe. O que aconteceria se você rebatesse uma bola de beisebol a 90% da velocidade da luz? Qual a velocidade máxima permitida para passar de carro por uma lombada sem morrer? Se os robôs causassem o apocalipse, quanto tempo a humanidade duraria? Em busca de atender a curiosidade de seus leitores, Munroe criou o também imensamente popular E se?, um blog destinado a resolver essas e outras grandes questões da humanidade.”

Vamos nos conectar?

Obrigada por ler até aqui! Um dos meus maiores objetivos é trocar conhecimentos e se conectar. Você me encontra no Linkedin e no Instagram!

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